sábado, maio 21, 2005

Porque não estás aqui?

Procuro-te. Relativamente alta e de corpo bem definido, aparência cuidada. De cabelo sedoso, comprido, ondulado ou escorrido; olhos meigos, espelho de alma ansiosa por descoberta, expressão de criança: curiosa e desprotegida, lábios perfeitos numa boca sequiosa de desejo, paixão.
Quero-te. Desperta e de vontade, que sabe falar, que quer argumentar, que gosta de escrever, registo. Numa carta assinas os desejos, vontades, razões, num texto acordamos compromisso.
Simples. Meiga, serena, expressiva e emotiva.
Porquê que ainda não chegas-te junto a mim?

Multidões

Vou a Lisboa ver um jogo de futebol e redescubro a minha fobia a aglomerados de gente.
Se há coisa que me mete mais medo que (hipoteticamente) o Bon Chic a correr na minha direcção é um conjunto de povo sem fim. Este medo surge a partir do momento que se torna difícil circular mais de cinco minutos sem avistar um ser que me dê vontade de esbofetear até à morte só pela sua singela aparência (não por ser pobre, ter a roupa rasgada, é mesmo porque há gente que só ao olhar mete o seu nojo), aliás só o circular já é difícil…
Outro ponto que me causa repulsa é o facto de a partir de três pessoas juntas se dar o nome de manada, e o comportamento faz jus, três pessoas bem formadas passam a ter comportamento estritamente animal, odioso.

Filmes de terror

Vejo um filme e fico com a noção que cada vez é mais ridículo o “terror”, talvez seja cada vez mais difícil fazer um ”bom terror”, de certo modo real, verosímil.
Mas porque raio é que há-de haver um espírito mau que ataca uma pessoa banal? Se há o tal espírito devia também aparecer o bom, o salvador que não digo que fosse ganhar ao mal, mas pelo menos ia tentar fazer-lhe frente (porque se for “o bom” e não tentasse defender o mero humano, não seria no mínimo altruísta).
Por outro lado, não percebo o porquê das pessoas que são atacadas nunca fazerem nada, deixam-se render ao seu fado, não vale a pena lutar…
Ou bem que fazem filmes baseados em historias reais, ou a ficção fica sempre com uma pontinha de aberração lógica. É pena.



A fé move montanhas, faz pessoas ficarem uma hora a ouvir um velho, faz acreditar todos os domingos que os nossos 11 jogadores são melhores aos demais. A fé impõe aos peregrinos viagens imensas, apostas irracionais, faz doentes regenerarem-se após anos de agonia, as estátuas chorar sangue.
É bonito, mas não acredito.

sábado, maio 07, 2005

Hoje...

Hoje é Natal. O relógio reflecte 1:48, acabo de ver um filme e escuto o redor e ouço o barulho do motor de carros que passam espaçados entre si. Reparo em mim, protegido do frio por uma t-shirt e hoje é verão. Medito sobre o que esta hora quase duas me ensinou, não sei ao certo, o registo não era teológico e no entanto atacou-me a ideia de que hoje é Natal. O Jesus não faz anos e hoje não há prendas e não faz o frio e as pessoas desprezam-se e hoje é Natal. Dizem que o é quando o Homem quiser, pois acho-me Homem e digo-o HOJE É NATAL, hoje como ontem as pessoas matam-se e roubam-se e acham-se e sofrem e querem-se e... amanhã tudo será igual.

O eu com o comigo

Por onde quer que vá, o que quer que faça, seja o que for que tenha, tu estás lá.
Quem quer que seja, para quem quer que fale, se ofender, tu escutas-me.

Eu. Eu ando sempre comigo, qualquer palavra proferida, uma acção realizada, até um pensamento tem sempre pelo menos uma testemunha.
Há quem não se dê bem consigo próprio, chamam-lhe consciência, personifico-o no “eu”.

Felizmente sou capaz de viver comigo; passo horas sozinho e não tenho vergonha de ti, és o ombro em que choro pois não és capaz de me rejeitar seja qual for o pecado que tenha realizado; de ti não me escondo até porque não seria capaz, contigo sorrio, de ti rio, contigo vou; não fujo de ti nem tento enganar-te. Eu e tu andamos sempre juntos, “eu” é um “nós”; sempre vigiado, talvez perseguido, sigo tranquilo, pois nunca estarei só. Obrigado por estares sempre presente.

(Isto soou um naco narcisista, mas é real. Não raras vezes critico-me, ofendo-me, chateio-me comigo, mas no fundo gosto imenso de mim. Acreditem, está longe de ser um defeito.)

Luz

Será que a luz tem medo do escuro?
Se a luz não tivesse a fobia do escuro decerto iria andar por aí feita maluca a vaguear por entre nós, mas não.
O olhar sobre o vazio é negro, escuro é a ausência de luz, porquê que a luz não está? A luz é uma menina bem comportada e só aparece quando a chamam, é bastante veloz e sempre pontual.
E o escuro é malvado, mal a luz parte aparece logo; suspeito que o escuro é tipo Calimero e anda sempre por trás dessa Abelha Maia que é a luz. O escuro é um ser aterrador, e todas as criancinhas tiveram medo dele, deve ser um sujeito barbudo que faz levedar as fobias e transforma os sons triviais em gritos maquiavélicos.
A luz quando incide transforma em sagrado o que fora profano, personifica o divino. Creio que todos nos rendemos a uma lança de luz vinda dos céus.

Típico português

Já está batido aquele tema do dar no português que é tudo quanto de mau possa haver, ele é tirar macacos do nariz, atirar lixo ao chão, dar umas chapadas à mulher, meus amigos tudo isto pode até ser verdade mas não vou pactuar com tais dogmas, eu sou português e creio que estamos longe de ser assim.

Depois da bela desmarcação toca a fazer a maluquice. Já reparam que há sempre um conhecido (ou UM português, e não OS portugueses) que diz “camion”, “travage” “gásoil” e similares? Bem sei que nem todos tivemos acesso ao ensino, que muitos são das aldeias remotas e há a tendência para “personalizar” termos, mas alguém me explicas modas estilo “então tá bê”? É que em tempos, e não foi à tanto quanto isso, tudo o que tinha dentes dizia isso.
Pior que palavras ridículas só mesmo expressões ainda mais ridículas tipo a atrás referida ou o “até a barraca abana!”, ou o mais recente “é já a seguir, é que é já a seguir”, não sei se é só a mim mas assalta-me súbita vontade de esbofetear até à morte quem as profere. Este sentimento é algo de típico, é aquela repulsa que se instala quando tentamos proteger-nos do ataque voraz de que somos alvo, porque violência verbal não deixa de ser violência.